O funeral do imperador Augusto e os 31 dias de agosto
A morte dos seres mais queridos nos quais Augusto depositara todas as esperanças de perpetuação dos seus êxitos, a traição de familiares implicados em conspirações contra o império e a instabilidade política desencadeada em várias províncias do território romano ensombraram os últimos anos da vida do imperador.
Quando já não tinha sequer voz para a leitura de documentos na Cúria, Augusto decidiu retirar-se definitivamente da vida pública. Morreu em Nola, na Campânia, no dia 19 de agosto do ano 14, aos 75 anos, 10 meses e 26 dias de idade. Faltavam somente 13 dias para se cumprirem 44 anos do seu governo imperial, um dos mais longos da história de Roma. Durante a sua longa vigência, "representara com fidelidade a farsa da vida", segundo as suas próprias palavras.
Lívia (esposa de Augusto) manteve secreta a notícia da sua morte até que Tibério (sucessor de Augusto no trono imperial) estivesse presente em Roma. O cadáver foi conduzido pelos notáveis de cada cidade pelas quais passava o cortejo fúnebre. Perto da capital, tomaram relevância os cavaleiros, que o conduziram ao Palatino durante a noite. No dia seguinte, no Senado, foram lidas as determinações do funeral que Augusto pedira por escrito, assim como as "Res gestae", mais tarde inscritas em duas colunas de bronze que flanqueavam a entrada no mausoléu familiar.
O corpo inerte do imperador foi conduzido ao Campo de Marte no interior de um féretro de marfim e ouro. Sobre ele, uma imagem de cera representava o defunto com roupas triunfais; atrás do cortejo, desfilavam atores mascarados que representavam os antepassados, humanos e divinos, da família imperial, recuando até aos tempos de Rómulo.
Druso, o Menor, filho de Tibério, leu o elogio fúnebre na tribuna dos oradores, ao mesmo tempo que o pai pronunciava outro discurso no templo do Divo Iulio. Só então os restos foram levados para a pira e, embora ainda ardesse, o iurator Numério Ático, alegadamente aliciado por Lívia com um suborno no valor de um milhão de sestércios, jurou que vira a alma do defunto ascender até aos céus.
Segundo o cronista Dião Cássio, as manifestações de pesar na cidade foram moderadas. Só muitos anos depois, quando os excessos tirânicos dos sucessores de Augusto fizeram relembrar o governo do primeiro imperador como um período de liberdade moderada e de monarquia não opressiva, é que o seu reinado foi ideologicamente recuperado e colocado em perspectiva. A história tem, com frequência, tendência a ser reponderada face às vicissitudes posteriores a cada reinado. Com Augusto, isso sucedeu seguramente.
Morto o líder, Lívia foi declarada herdeira de um terço do património da família e adotada como filha de Augusto. Converteu-se na sacerdotisa oficial do culto do princeps divinizado. Os cônsules encarregaram-se anualmente da celebração do nascimento de Augusto e deu-se o nome de augustus (agosto) ao mês da sua morte, adicionando-lhe por isso mais um dia (na altura tinha apenas 30), descontado no mês de fevereiro (à época, o segundo mês do ano também tinha 30 dias). É essa a razão para a excentricidade de fevereiro ser o mês mais curto do ano no nosso calendário moderno.